É possível amar sem apego? Robina Courtin e sua abordagem radical com a mente.

Por Robina Courtin | Tradução Luís Oliveira

Primeiro de tudo, nós achamos que o amor e o apego significam a mesma coisa. Mas o caminho budista de compreender nossas emoções diz que o apego é nossa parte necessitada, neurótica e insatisfeita que anseia por alguém lá fora, acreditando que quando chegarmos a esse alguém, nós estaremos felizes.

O amor, por outro lado, refere-se a uma parte altruísta do nosso ser – uma conexão com os outros, desejo que eles sejam felizes, e deliciar-se com o seu bem-estar. Temos esses dois, é claro, mas é difícil ver a diferença. Eles são como leite e água misturados. Se há alguma alegria em nosso relacionamento, é por causa do amor. Se há raiva, mágoa, inveja e todo o resto, é o resultado do apego. Mas é tão difícil ver isso.

O apego é uma palavra tão simples, mas é multi-facetada. No nível mais fundamental é aquele sentimento de carência dentro de nós; aquela crença que de alguma forma eu não sou o suficiente, eu não tenho o suficiente, e não importa o que eu faço ou o que eu tenho, nunca é suficiente. Então, é claro, porque estamos tão convencidos que isso é verdade, nós ansiamos por alguém lá fora, e quando encontramos esse alguém que aciona os nossos bons sentimentos, nós nos apegamos na ideia de te-los para nós, convencidos que vão preencher nossas necessidades e nos fazer verdadeiramente felizes e contentes. Nós assumimos que eles são nossa posse, quase uma extensão de quem nós somos.

“No nível mais fundamental, o apego é esse sentimento de carência dentro de nós; aquela crença que de alguma forma ‘Eu não sou o suficiente “

A fonte de infelicidade

Esse apego é a fonte de todas as outras nossas emoções infelizes. Porque ele está desesperado para conseguir o que quer, no minuto em que não consegue – o momento em que ele não liga ou chega em casa tarde, ou olha para outra pessoa – o pânico surge e imediatamente se transforma em raiva e, e em seguida, em ciúme ou baixa auto-estima, ou em qualquer um de nossos velhos hábitos que costumamos manifestar. Na verdade, a raiva é a reação quando o apego não consegue o que quer. Todos esses pressupostos estão enraizados tão profundamente dentro de nós, e nós acreditamos totalmente nessas histórias, que parece ridículo mesmo questioná-las. Mas precisamos. E a única maneira que podemos fazer isso, é conhecendo nossas próprias mentes e sentimentos: em outras palavras, é preciso aprender a ser nossos próprios terapeutas.

O fato é que o apego, a raiva, o ciúme e qualquer outra emoção aflitiva não estão gravadas em pedra; eles são velhos hábitos, e sabemos que podemos muda-los. O primeiro passo é ter a certeza de que, conhecendo bem nossas próprias mentes, podemos aprender a distinguir as várias emoções dentro de nós e, gradualmente, aprender a mudá-las. O primeiro desafio envolve realmente acreditar que você pode fazer isso. E isso apenas, já é algo enorme – sem essa confiança, estamos presos e empacados.

A próxima etapa é dar um passo para trás de toda a conversa sem fim em nossas mentes. Uma maneira muito simples de fazer isso – é tão básico que é chato! – é, apenas alguns minutos todas as manhãs, antes de começarmos o nosso dia, se sentar e focar em algo. A respiração é um bom começo. Não é nada de especial; não há nenhum truque; não é algo místico. É uma técnica psicológica prática. Com determinação você pode decidir ter atenção plena na respiração – na sensação em suas narinas enquanto você inspira e expira. No momento em que sua mente divagar, traga seu foco de volta para a respiração. O objetivo não é fazer os pensamentos irem embora; mas não se envolver com eles, e aprender a deixá-los ir e vir.

O resultado a longo prazo de uma técnica como esta é uma mente super focada, e isso vai levar tempo. Mas o benefício quase imediato será que, à medida que experimentamos dar um passo para trás de todas as histórias em nossa cabeça, nós começaremos a ser objetivos sobre essas histórias e lentamente começamos a desvendar, desconstruir e, eventualmente, mudá-las. Diz-se que um dos sinais que estamos indo bem na prática é ter a impressão que estamos cada vez pior! Mas nós não estamos. Estamos começando a ouvir as histórias de forma mais clara, ai então é que podemos começar a mudá-las.

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Robina Courtin

A Venerável Robina Courtin, ou Ven. Rob.,  é uma professora do dharma que o transmite de forma dinâmica e franca. Desde a sua ordenação no final de 1970, a ex-cantora australiana tem trabalhado em tempo integral com a “Fundação pela Preservação da Tradição Mahayana” de Lama Thubten Yeshe e Lama Zopa Rinpoche. Ela atuou como diretora editorial da Wisdom Publications, editora da Mandala Magazine, e diretora-executiva do Liberation Prison Project. E viaja incansavelmente para ensinar o dharma ao redor do mundo. Sua vida e trabalho com os presos foi destaque nos documentários Chasing Buddha e Key to Freedom. Você pode acessar aqui o site dela, e obter mais informações sobre seus projetos.

Ela é descrita como engraçada, dinâmica, carinhosa, amável e audaciosa, com sua fala freqüentemente pontilhada com palavras fortes. Tudo isso, falando a mil por hora, provando que você não necessariamente tem que ser sereno e quieto para ser budista. Ven. Robina diz: “Eu estou trabalhando radicalmente na minha própria mente. Não acreditando na forma como as coisas aparecem para nós: Você não consegue ser mais radical do que isso. Eu quero olhar para o componente interno, e não o externo. Quero desenraizar as causas de todo o sofrimento, que são mentais. Quanto a isso, estou mais radical do que nunca, mais radical do que quando era ativista feminista ou brigava pelo meu ideal político quando jovem.”

Assista abaixo dois vídeos incríveis dela, legendados. No primeiro “Seja seu próprio terapeuta”, Robina apresenta o budismo de uma forma clara e pontual para um público de funcionários do Google. No segundo, ela fala sobre o trabalho com as emoções negativas na vida diária.Um momento que me chamou atenção foi quando ela responde a uma pessoa, que perguntou como ajudar e ensinar seus filhos a lidar com suas mentes, ou crianças no geral e ela responde: “Como eu posso ensinar piano para uma criança? O que eu tenho que fazer? Qual seria a sua primeira resposta? “Eu tenho que saber tocar”, não é? Assim, a medida que você conhece a sua mente, é a medida exata, ou máxima, que você pode ajudar os demais. Você tem que aprender a ser introspectivo. Você tem que conhecer sua raiva, os seus medos, o seu ciúme, o seu potencial, o seu amor, a sua compaixão. Desse modo, você está perfeitamente qualificada(o) para ver a mente daquela criança. E se você ainda não olhou para si mesma, você esta incapaz de ajudar a criança.” 

Mais sobre amor e apego…

“Amor” romântico, amor genuíno e as relações: Jetsuma Tenzin Palmo, Matthieu Ricard e Dzongsar Khyentse Rinpoche falam sobre.

 

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