Vacuidade e Interdependência: “Qual “eu”?” "Como 'eu' e 'ego' diferem?" — Elizabeth Mattis Namgyel

Vacuidade e Interdependência – “Qual “eu”?”

Pergunta: Como posso me desapegar mais e mais do “eu”/”self”, quando me identifico fortemente com este “eu” na vida diária? Em “meu” caso eu o utilizo para confortar as pessoas… “Eu sei como você se sente, isso aconteceu comigo, etc”. Como alguém aprofunda a prática de identificar-se mais com o “eu funcional” que que beneficia seres… e dissolver ainda mais o eu que está centrado no ego, mesmo que usado para confortar outros. Eu penso nisso como jogar gotas de “vacuidade” a uma maior consciência e dissolver ainda mais o ego.

Resposta: Eu não tenho certeza se o “eu” é o problema real. O ponto é entender a natureza do que supomos ser um ”eu”. O que você se refere como “eu” é apenas a vida e a experiência e a consciência de tudo isso. De vez em quando tente olhar para uma coisa singular que você chama de ”eu”. Você vai ver o movimento contínuo, humores atmosféricos indo e vindo como o clima, as idéias piscando, mas sem realmente se fixar em nenhum lugar particular, e embora possam surgir vividamente – às vezes com intensidade – toda essa experiência vai escapar quando você procurá-lo. Por mais que você tente, você não será capaz de identificar onde o ”eu” termina e o mundo começa. Em outras palavras, existe apenas esta dança contínua entre o que você pode identificar como seus mundos internos e externos, mas você não será capaz de separá-los ou dizer que eles são os mesmos. “Você” não será capaz de identificar um “eu” singular, permanente ou independente.

Eu não acho que você precise ou que possa se desvincular do “eu”. Você não será capaz de separar-se deste assim chamado “eu” porque, na verdade, seria preciso encontrá-lo primeiro. E como ele continua a mudar com a chamada experiência “exterior”, não acho que isso vá ocorrer.

Tente pensar no “eu” como apenas “ser/estar” e responder ao mundo à sua volta com inteligência. Você é uma parte da grande natureza de infinita interdependência. Desta forma, você não é o mesmo ou esta separado de nada. Você não pode separar sua consciência da vida em torno de você. Portanto, você não pode dizer que é independente ou separado do outro. E no entanto, você não pode realmente dizer que você é idêntico ao outro. Então, como “livrar-se” desse tal ”eu”?

Isto é o que nós aprendemos com os grandes mestres, como Nagarjuna. Podemos estudar e fazer as contemplações no “eu” – elas são incrivelmente poderosas. Mas, em última análise entender quem você é uma experiência vivida – de uma forma muito natural. Então, conforme você responde ao mundo á sua volta, você pode compartilhar sua experiência de ser humano com os outros. Pode compartilhar suas alegrias, tristezas, desafios e questões, assim como está fazendo. Só porque você não consegue encontrar um “eu” permanente ou independente não significa que as coisas não funcionam. O “eu” funcional responde a vida. “Funcional” significa que as coisas se movem, e elas se movem porque não são singulares, permanentes, ou independentes. Se elas não estivessem em relação uma com as outras – se existissem de uma forma particular – não haveria nenhum movimento. Tudo seria inerte.

Então não se preocupe muito com o “eu” e apenas responda aos outros com bondade. Esta será uma grande bondade para seu “eu” porque você não vai sentir a necessidade de ver o seu “eu” como um problema. Então, quem se importa com um “eu” que não podemos encontrar mesmo após uma investigação! Você vai estar muito ocupado desfrutando o seu lugar em um universo de infinitas possibilidades para se preocupar com essa coisa singular e separada que você nunca consegue achar.

Sim, às vezes esse chamado “você” vai começar a contrair ou se retirar, rejeitar, solidificar, você vai sentir separatividade e dor de não saber quem você realmente é… pode chamar isso de “estado” de dor do ego, se quiser. Mas não é uma coisa. Pelo contrário, é uma percepção equivocada de sua verdadeira natureza. Então, apenas lembre disso. E em seguida, volte para o compromisso de viver plenamente.

lizmattis

Elizabeth Mattis Namgyel tem estudado e praticado o budadharma por vinte e cinco anos sob a orientação de seu professor e marido, Dzigar Kongtrul Rinpoche. Depois de conhecer Rinpoche no Nepal, ela tornou-se sua primeira aluna ocidental. Ela esta intimamente ligada com o trabalho de Rinpoche em trazer sabedoria budista para o Ocidente, particularmente com o desenvolvimento do Mangala Shri Bhuti, uma organização dedicada ao estudo e prática da linhagem Longchen Nyingtik.

Elizabeth tem um backround acadêmico em Antropologia e Estudos Budistas, mas seu aprendizado também está fundamentado na prática. Ela passou sete anos em retiro solitário, e é mestre de retiros no Longchen Jigme Samten Ling, centro de retiro do Mangala Shri Bhuti no sul do Colorado. Ela ensina regularmente o budadharma nos Estados Unidos e na Europa, editou dois livros de Rinpoche e é autora de “The Power of an Open Question”.

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