OTIMISMO, PESSIMISMO E INGENUIDADE

Ela adorava a chuva tanto quanto o sol.

Seus menores pensamentos tinham uma coloração alegre como as flores belas, vigorosas, agradáveis aos olhos.

ALAIN

Certa manhã, pátio do monastério, eu olhava para uma árvore com algumas flores vermelhas, onde estavam pousados talvez uma dúzia de pardais. Tudo o que eu via produzia em mim em sentimento de júbilo interior e de percepção da pureza infinita dos fenômenos. Focei minha mente a entrar em uma disposição mais depressiva e invoquei todo tipo de sentimentos negativos. De um momento para outro, a árvore me pareceu poeirenta, as flores murchas e o chilrear dos pardais começou a me irritar. Perguntei-me qual era a maneira correta de olhar para as coisas e cheguei à conclusão de que era a primeira, porque gerou uma atitude aberta, criativa e libertadora, que se traduziu em uma grande satisfação. Uma atitude assim permite que abracemos o universo e os seres, fazendo desaparecer qualquer divisão egocêntrica entre o eu e o mundo. Já quando nos agarramos a uma percepção “impura” dos fenômenos, algo soa falso – sentimo-nos “desconectados” do universo, que então aprece tedioso, estranho, distante, artificial e às vezes hostil.

AS ACUSAÇÕES INFUNDADAS CONTRA O OTIMISMO

Por muito tempo os psicólogos acreditaram que as pessoas ligeiramente depressivas eram as mais “realistas”. Com efeito, os otimistas têm tendência a se referir com maior frequência aos eventos prazerosos do que às situações dolorosas e a superestimar o seu desempenho passado e a maestria que exerceram sobre as coisas. Pesquisadores submeteram um grupo de pessoas a uma série de questões com certa dificuldade, de tal modo que elas errariam, em média, uma a cada duas perguntas. A cada resposta, os participantes eram informados do resultado, mas a sua pontuação final não lhes era comunicada. No dia seguinte, quando os pesquisadores perguntaram a cada um deles a respeito do que esperavam da pontuação total, as pessoas ligeiramente deprimidas estimaram corretamente terem se enganado um vez a cada duas questões, ao passo que os otimistas pensaram que só tinham se enganado uma vez a cada quatro.

O pessimista teria, então, tendência a andar com os olhos bem abertos e avaliar as situações mais lucidamente do que o otimista. “Ainda que a realidade não seja sempre divertida, você deve ver as coisas como são”, ele poderia dizer. O otimista, por outro lado, seria um exultante mas incurável sonhador, sempre ingênuo. “Logo a vida vai fazê-lo ter os pés no chão”, pensamos. Acontece que nada disso é verdade. Estudos posteriores mostraram que é preciso não se contentar com a avaliação objetiva, distanciada e desconfiada da realidade a que se abandonam os pessimistas. Quando não se trata de testes que lembram jogos, mas sim de situações reais, extraídas da vida diária, a abordagem do otimista é mais pragmática do que a do pessimista. Por exemplo: se mostrarmos a um grupo de mulheres que bebem café um relatório sobre o aumento do risco de câncer no seio com o uso de cafeína, ou mostrarmos a um grupo de pessoas que gostam de tomar banho de sol outro relatório dizendo que essa prática aumenta o risco de câncer de pele, uma semana depois os otimistas se lembrarão melhor dos detalhes desses relatórios do que os pessimistas, levando-os mais em consideração na sua conduta. Mais ainda, os otimistas concentram-se de maneira atenta e seletiva nos riscos que de fato lhes dizem respeito, em vez de se inquietarem de maneira inútil e ineficaz com tudo. Desse modo, permanecem mais serenos do que os pessimistas e poupam sua energia para os perigos reais.

Se observamos a maneira como as pessoas percebem os acontecimentos da sua vida, apreciam a qualidade do momento vivido, e criam o seu futuro superando obstáculos graças a uma atitude aberta e criativa, percebemos que os otimistas têm uma vantagem inegável sobre os pessimistas. Muitos estudos mostram que eles têm mais sucesso nos exames, na profissão que escolheram e nos seus relacionamentos; que vivem mais e com mais saúde, têm uma probabilidade maior de sobreviver aos traumas pós-operatórios e são menos propensos à depressão e ao suicídio.4 Nada mal, não é? Em 1960, realizou-se um estudo com mais de novecentas pessoas internadas em um hospital americano. Avaliou-se, através de testes e questionários, o grau de otimismo e outros traços psicológicos desses sujeitos. Quarenta anos mais tarde, o estudo demonstrou que os otimistas viveram 19% mais do que os pessimistas – para um octogenário, isso representa dezesseis anos a mais de vida. 5 Além disso, Martin Seligman mostra que os pessimistas têm oito vezes mais chance de ficarem deprimidos quando as coisas vão mal, e seu desempenho na escola, nos esportes e no trabalho é inferior ao que seria de esperar pelo seu talento e capacidade. Mostrou também que é o pessimismo que agrava a depressão e as outras dificuldades citadas e não o contrário, e que quando se ensina a essas pessoas como superar o pessimismo mudando a sua perspectiva, elas se tornam muito menos sujeitas a recaídas da depressão. Os psicólogos descrevem o pessimismo como um “modo de explicação” do mundo que gera uma “impotência adquirida”.

DUAS MANEIRAS DE VER O MUNDO

O Otimista é uma pessoa que considera as duas dificuldades como momentâneas, controláveis e ligadas a uma situação específica. Ele dirá: “Não há motivo para fazer tanto barulho, essas coisas não duram. Eu vou encontrar uma solução e, de todo modo, em geral dá tudo certo.” O pessimista, ao contrário, pensa que os seus problemas vão durar (“Este é o tipo de coisa que não se resolve sozinha”), comprometendo tudo o que ele empreende e que escapa ao seu controle (“O que você quer que eu faça?”). Ele imagina ter em si algum tipo de imperfeição determinante (“Não importa o que eu faça, é sempre a mesma coisa”), presume que a situação não tem saída e conclui: “Não nasci para ser feliz.”

O sentimento de insegurança que aflige tantas pessoas hoje em dia está intimamente ligado ao pessimismo. O pessimista antecipa o desastre e torna-se uma vítima crônica da ansiedade e da dúvida. Mal-humorado, irritável e nervoso, não tem confiança nem no mundo nem em si mesmo, e sempre espera ser intimidado, abandonado e ignorado.

Eis uma anedota sobre um pessimista. Em um belo dia de verão, um motorista passava por uma região do interior do país quando um dos pneus do seu carro furou, no meio do nada. Para tornar as coisas ainda piores, descobriu que não tinha um macaco para erguer o carro e trocar o pneu. O lugar era praticamente deserto. Havia apenas uma casa solitária à vista, na subida de um morro. Depois de alguns minutos de hesitação, o viajante decidiu ir até lá e pedir um macaco emprestado. No caminho, começou a pensar: “Mas se o dono não quiser me emprestar o macaco? Vai ser muito ruim se ele me deixar nessa situação!” À medida que se aproximava da casa, foi ficando cada vez mais contrariado. “Eu nunca faria isso com um estranho. Seria odioso!” Finalmente, bateu na porta da frente da casa e, quando o dono a abriu, gritou: “Pode ficar com o seu macaco, seu filho-da-mãe!”

O otimista, por outro lado, acredita que é possível realizar as suas aspirações e que, com paciência, determinação e inteligência, chegará lá. E o que acontece é que, quase sempre, ele chega mesmo.

Na vida diária, o pessimista é aquele que já começa adotando uma atitude de recusa, mesmo que ela seja totalmente inadequada. Lembro-me de um oficial butanês com quem eu costumava tratar. Cada vez que eu lhe fazia uma pergunta, ele respondia “não, não, não” qualquer que fosse a frase, o que dava às nossas conversas um tom cômico.

“O senhor acha que podemos partir amanhã cedo?”

“Não, não, não… esteja pronto para sair às nove da manhã.”

O pessimista é desconfiado e raras vezes concede o benefício da dúvida. Como diz Alain: “Se o cumprimentam, é para ridicularizá-lo; se o ajudam, para humilhá-lo. O segredo é um complô obscuro. Esses males da imaginação não têm remédio, no sentido de que, para o homem infeliz, os melhores acontecimentos sorriem em vão. Ele não tem mais vontade de acreditar na felicidade.”  Do ponto de vista subjetivo, os otimistas gozam de um bem-estar muito maior e abordam as relações ou situações novas com muito mais confiança do que suspeita.

Talvez os pessimistas encarem essa enumeração de vantagens como uma forma de agressão arrogante e inoportuna, imaginando que a felicidade é impossível. Se o pessimismo e o sofrimento fossem tão imutáveis quanto as impressões digitais ou a cor dos olhos, seria muito mais delicado não falar sobre os benefícios da felicidade e do otimismo. Mas se o otimismo é uma maneira de ver a vida e a felicidade, uma condição que pode ser cultivada, comecemos o trabalho imediatamente, sem mais delongas ou tergiversações. Como escreveu Alain: “Como seria maravilhosa a sociedade dos homens se cada um pusesse a sua lenha na fogueira, em vez de ficar chorando sobre as cinzas!”

Mesmo se nascemos com certa predisposição para ver a vida cor-de-rosa, e se a influência daqueles que nos elevam pode fazer com que a nossa atitude tenda para o pessimismo ou para o otimismo, a nossa interpretação do mundo pode mais tarde mudar, e de maneira considerável, porque a nossa mente é flexível.

Não nos detenhamos na imagem irreal do otimismo beato. Para além desse clichê com o qual adoramos perturbar os otimistas, oculta-se uma série de qualidades: determinação, faculdade de adaptação, lucidez, serenidade e força de caráter, pragmatismo, coragem e até mesmo audácia, todas essas encontradas em sukha, a verdadeira felicidade.

Para um otimista, não faz sentido perder a determinação. Sempre se pode fazer alguma coisa (em vez de ficar se sentindo desesperado, resignado ou desgostoso com a vida); limitar os estragos (no lugar de deixar tudo se arruinar); descobrir uma solução alternativa (em vez de chafurdar na autopiedade pelo fracasso); reconstruir o que foi destruído (em vez de dizer “é o fim de tudo!”); tomar a situação corrente como um pouco de partida (no lugar de perder tempo chorando pelo passado e lamentando o presente); recomeçar do nada (em vez de terminar em nada); compreender que é essencial se esforçar sempre na direção que parece ser a melhor (em vez de ficar paralisado pela indecisão e pelo fatalismo); e usar cada momento presente para avançar, apreciar, agir e desfrutar o bem-estar interior (em vez de perder tempo ruminando o passado e temendo o futuro).

Mas há aqueles que dizem, como fazendeiro australiano entrevistado por uma estação de rádio durante os incêndios florestais em 2001: “Perdi tudo, nunca mais vou conseguir reconstruir a minha vida.” E há pessoas como o navegador Jacques-Yves Le Toumelin, que, ao ver em chamas o seu primeiro barco, incendiado pelos alemães em 1944, parafraseou Rudyard Kipling: “Se tu podes ver destruída a obra da tua vida e sem perder tempo, colocar novamente tuas mãos à obra, então serás um homem, meu filho”. Sem tardar, ele construiu um novo barco, com o qual deu a volta ao mundo, velejando sozinho.

A presença é definida pelos psicólogos com a convicção de que é possível encontrar os meios para realizar as nossas metas, desenvolvendo a motivação necessária para isso. Sabe-se que o otimismo melhora as notas dos estudantes em seus exames, bem como o desempenho dos atletas, ajuda a suportar as doenças e as enfermidades debilitantes, e torna a própria dor mais fácil de ser tolerada (como dores de queimaduras, de artrite, de contusões na coluna vertebral, ou diante da cegueira). Usando um método para mensurar a resistência à dor foi possível demonstrar, por exemplo, que pessoas que manifestam tendência marcante para ao otimismo são capazes de tolerar o contato com uma superfície muito fria por um tempo dias vezes maior do que aquelas que não a manifestam.

 O estudo de um grupo de doze mulheres atingidas pelo câncer no seio, acompanhadas durante quinze anos, e um estudo similar com homens portadores do vírus da AIDS mostraram que, após descobrirem que têm uma doença incurável, aqueles que pensaram “não tem mais jeito” ou “vou morrer”, caindo em uma resignação passiva ou desesperada, morreram mais depressa do que os que aproveitaram os derradeiros meses da sua vida para reavaliar suas propriedades e utilizar o tempo que lhes restava da maneira mais construtiva possível.

DETERMINAÇÃO

 Esta atitude é o oposto da preguiça. Há vários tipos de preguiça, mas eles podem ser agrupados em três principais. O primeiro e mais óbvio é não querer nada senão comer bem, dormir bem e fazer o menos possível. O segundo, o mais paralisante de todos, leva-nos a abandonar a corrida antes ainda de ser dada a alargada. Dizemo-nos: “Ah, isso não é para mim, está além das minhas capacidades”. O terceiro, o mais pernicioso, consiste em saber o que de fato importa na vida, mas sempre deixar o essencial para mais tarde, dedicando-se a mil coisas de menor importância.

O otimista não desiste com facilidade. Fortalecido pela determinação de obter sucesso, ele persevera mais e costuma ser mais bem-sucedido do que o pessimista em condições adversas. O pessimista tem tendência a recuar diante das dificuldades, resignar-se ou distrair-se com ocupações que não resolvem seus problemas. Tem pouca determinação, pois as suas dúvidas atingem tudo e a todos, antecipando o fracasso de cada empreendimento (em vez do potencial para crescer, desenvolver-se e dar frutos), e vê o mal-intencionado, o aproveitador e o egoísta em todas as pessoas. Vê uma ameaça em cada novidade e está sempre antecipando uma catástrofe. Em síntese, ao ouvir o ranger de uma porta, o tomista pensa que ela está se abrindo, e o pessimista, que ela está se fechando.

Há poucos anos fui para a França a fim de discutir maneiras de empreender projetos humanitários no Tibete, apesar das condições opressivas impostas pelo governo chinês. Quinze minutos depois do início da reunião, alguém disse, referindo-se a mim e a um dos outros participantes: “Vocês falam sobre a mesma coisa como se fossem dois mundos diferentes. Um acha que tudo acabará mal e o outro, que tudo acabará bem.” O primeiro participante disse: “Para começar, é pouco provável que as autoridades aceitem vocês nessa região e, portanto, correm o risco de ser imediatamente expulsos. E depois, como farão para conseguir permissão para construir uma escola? E mesmo que consigam começar a obra, serão enganados pelos empreiteiros, que estão em conluio com os corruptos poderes locais. Além disso, não esqueçam de que nunca conseguirão forçá-los a ensinar em tibetano, ou seja, as aulas acabarão sendo dadas em chinês.” Pessoalmente, achei sua fala difícil de suportar, dando-me vontade de sair dali o mais rápido possível, passar através das malhas da rede e fazer os projetos decolarem. Passados cinco anos, trabalhando com um amigo entusiástico e recebendo a ajuda de generosos benfeitores, construímos dezesseis postos de saúde, oito escolas e doze pontes. Em muitos casos, nossos amigos locais só solicitaram a permissão para construir depois que a clínica ou a escola já estavam prontas. Nesses lugares, milhares de pacientes e crianças receberam tratamento e educação. As autoridades locais, de início reticentes, hoje estão cheias de entusiasmo, pois encontram um jeito de incluir esses projetos nas suas estatísticas. Do nosso ponto de vista, o objetivo que buscávamos – ajudar aqueles que necessitam – foi atingido.

Mesmo que o otimista seja um pouco sonhador quando olha para o futuro, dizendo a si mesmo que no fim tudo dará certo – quando nem sempre é isso o que acontece -, a sua atitude traz mais frutos, já que, com a esperança de empreender cem projetos seguida de uma ação diligente, acabará por completar cinquenta. Se, ao contrário, limitar-se a empreender meros dez, o pessimista poderá, na melhor das hipóteses, completar cinco ou talvez até menos, já que dedicará pouca energia a uma tarefa que ele, desde o início, julga condenada ao fracasso.

Nos países em que há grande pobreza e opressão encontro muitas pessoas que, inspiradas por essas condições, se dedicam a prestar alguma ajuda. A maior parte delas é composta de otimistas que enfrentam a distância entre a imensidão da tarefa e a precariedade dos recursos disponíveis. Tenho um amigo, Malcolm McOdell, que, juntamente com sua esposa, vem realizando um trabalho pelo desenvolvimento do Nepal há mais de trinta anos, baseando-se no princípio da “investigação apreciativa”, uma aplicação bastante prática do otimismo.

“Assim que chego em um vilarejo”, ele explica, “a primeira reação que as pessoas têm é reclamar das suas dificuldades. Digo a elas: ‘Calma, é impossível que vocês só tenham problemas. Falem-me dos seus recursos e das boas qualidades que existem neste vilarejo e em cada um de vocês.’ Nós nos reunimos, à vezes à noite, em torno de uma fogueira. As mentes e línguas se soltam e, com um tipo totalmente novo de entusiasmo, os aldeões fazem uma lista dos seus talentos, capacidades e recursos. Peço-lhes então para imaginar como poderiam, todos juntos, colocar tais qualidades a favor da comunidade. Assim que terminaram a elaboração de um plano, faço a pergunta final: ‘Quem, dentre vocês, está preparado, aqui e agora, para assumir a responsabilidade de tal e tal aspecto do programa?’”. As mãos se erguem, promessas são feitas, e o trabalho começa logo nos dias seguintes. Essa abordagem está a ano-luz de distância daquela seguida pelos catalogadores de problemas, que conseguem realizar menos, com menor qualidade e levando mais tempo. McOdell preocupa-se em especial em dar melhores condições para as mulheres nepalesas, sendo que cerca de trinta mil delas hoje se beneficiam das suas iniciativas.

ADAPTABILIDADE

É interessante notar que, quando as dificuldades parecem insuperáveis, os tomistas reagem de maneira mais construtiva e criativa: eles aceitam os fatos com realismo, sabem como identificar o lado positivo da adversidade, tiram lições dos acontecimentos e propõem uma solução alternativa ou passam para um novo projeto. Os pessimistas preferem se distanciar do problema oi adotar estratégias escapistas – como recorrer ao sono, ao isolamento, ao uso de álcool ou drogas -, que diminuem a tomada de consciência dos seus problemas. Em vez de enfrentá-los com determinação, eles preferem ficar ruminando a sua infelicidade, nutrindo ilusões, sonhando com soluções “mágicas” e acusando o mundo inteiro de estar contra eles. Com frequência, os pessimistas têm grandes dificuldades em extrair lições do seu passado, o que leva à repetição dos seus problemas. São mais fatalistas (“Eu disse que isso não ia dar certo. É sempre a mesma coisa, não importa o que eu faça”) e com facilidade se vêem como “simples peões no jogo da vida”.

SERENIDADE

Por ter antecipado e testado até o fim todos os caminhos possíveis, o otimista, mesmo quando passa por um fracasso momentâneo, está livre de arrependimentos e do sentimento de culpa. Ele sabe como dar uma passo atrás e está sempre pronto para imaginar uma nova solução, sem levar consigo o peso das derrotas precedentes e sem ficar imaginando que o pior espera por ele na próxima esquina. Desse modo, mantém a sua serenidade. A sua confiança é tão sólida quanto a proa de um navio que singra o seu caminho pelas águas da vida, sejam elas calmas ou tempestuosas.

Um amigo que vive no Nepal me contou que, certa vez, precisava pegar um avião para dar uma importante palestra na Holanda no dia seguinte. Os organizadores haviam alugado uma sala, anunciado a conferência nos jornais e esperavam uma audiência de milhares de pessoas. Chegando ao aeroporto, soube que o seu vôo havia sido cancelado e que não havia outra maneira de sair do Nepal naquela noite. Ele me disse: “Eu sentia muitíssimo pelos organizadores, mas não havia nada que eu pudesse fazer. Foi então que uma grande calma tomou conta de mim. Eu acabara de me despedir de meus amigos em Katmandu e à minha frente meu destino tinha desaparecido por completo. Vivi um sentimento deliciosamente leve de liberdade. Na calçada, do lado de fora do aeroporto, sentei-me sobre a minha bagagem e brinquei com os porteiros e as crianças de rua que estavam ali por perto. Sorrio ao pensar que, se tivesse ficado doente de preocupação, isso não teria servido de nada. Depois de uma meia hora, levantei-me e voltei, a pé, para Katmandu, com minha pequena mochila, deleitando-me com o frio do crepúsculo…”

Lembro-me de uma viagem que fiz, certa ocasião, para o Tibete oriental. Chuvas torrenciais, junto com o desmatamento quase completo das florestas levado a cabo pelos chineses, tinham dado origem a enchentes devastadoras. O nosso veículo 4×4 avançava com dificuldade por uma estrada totalmente esburacada, no fundo de um desfiladeiro abissal, ao longo do curso de um rio que se transformara em uma torrente gigantesca e furiosa. Brilhando na luz amarelada do anoitecer, os paredões rochosos pareciam erguer-se até o céu, ecoando o ribombar das águas. A maior parte das pontes tinha sido carregada, e as águas turbulentas estavam erodindo a única estrada transitável que ainda existia. A cada instante, rochas desabavam dos flancos escarpados, despedaçando-se ruidosamente no pavimento. Era um bom teste para o otimismo dos passageiros. As diferenças entre eles eram enormes. Alguns estavam tão aflitos que queriam parar, apesar de não poderem buscar abrigo em lugar algum. Outros levavam tudo aquilo com compostura, impassíveis, quase se divertindo, e queriam seguir em frente para sair dali o mais rapidamente possível. Um de nós, no final, disse àquele que estava mais ansioso: “Você adora filmes de ação. Então, hoje é o seu dia de sorte – você está dentro de um!” Todos nós desatamos a rir e criamos coragem.

SIGNIFICADO

Mas há uma dimensão ainda mais profunda do otimismo, a da realização do potencial de transformação que mencionamos várias vezes e que está presente em cada ser humano, seja qual for a sua condição. É esse potencial, afinal, que dá sentido à vida humana. O pessimismo definitivo consiste em pensar que a vida, como um todo, não vale a pena ser vivida. O otimismo definitivo, por sua vez, consiste em compreender que cada momento que passa é um tesouro, tanto na alegria quando na adversidade. Não são simples nuances, mas uma diferença radical na maneira de ver as coisas. Essa divergência de perspectivas está ligada ao fato de termos ou não descoberto, dentro de nós, essa plenitude que, por si só, alimenta a paz interior e a serenidade, a cada instante.

EXERCÍCIO Vivenciar a mesma situação através dos olhos do otimismo e do pessimismo

Tome como exemplo uma viagem de avião. Imagine que você está fazendo uma longa viagem de avião, a caminho de uma cidade estranha, para começar um novo emprego. De repente, o avião passa por uma turbulência. Você vê as asas sacudindo e visualiza o desastre que virá em seguida. Quando a tormenta passa, você percebe que o seu assento é apertado demais. Não consegue encontrar uma posição confortável, e a sua mente se enche de reclamações sobre o estado a que chegaram as viagens de avião. Começa a se aborrecer com o fato de a aeromoça demorar para trazer a sua bebida. Quando pensa no seu novo emprego, tem certeza de que as pessoas que encontrará lá não vão gostar de você. Eles vão desprezar o seu conhecimento, excluí-lo dos projetos mais interessantes, e talvez cheguem a ponto de trapacear com você. Sem dúvida, esta viagem será uma catástrofe. Como pôde pensar que daria conta de lidar com tudo isso? Você está apavorado.

Vivencie o estado de depressão e desânimo criado por esses pensamentos.

Experimente então outra maneira de viver a mesma situação:

Quando o avião passa pela turbulência, você sabe que isso faz parte da jornada e sente vividamente que aquele instante que está vivendo é precioso. Assim que a tormenta se acalma, sente-se grata e espera poder usar o resto da sua vida de forma construtiva. Apesar do fato de que o seus assento não é particularmente confortável, você encontra algumas posições que aliviam sua tensão nas costas e nas pernas. Você aprecia a cortesia e a disponibilidade da aeromoça, tão ocupada que tem que ficar o vôo todo em pé. Sente uma grande excitação com as aventuras que esperam por você. Imagina que as pessoas, lá, serão interessantes e produtivas, e que terá muitas oportunidades novas. Está convencido de que as suas atividades florescerão e que você ter os recursos interiores para superar quaisquer obstáculos que possam surgir.

Vivencie esse alegre estado de espírito, em sintonia com o positivo.

Aprecie as diferenças que existem entre estes dois estados mentais e compreenda que eles surgem por meio do funcionamento da sua mente, apesar de a situação exterior continuar igual.

 ”Trecho do livro FELICIDADE – A PRÁTICA DO BEM ESTAR”.

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